"O sol do futuro" (Nanni Moretti, 2023)

Por Victor Cardozo

Giovanni (Moretti) é um cineasta veterano italiano que faz um novo filme "a cada cinco anos". Durante a nova filmagem, ele se vê, mais uma vez, diante de um impasse existencial generalizado na vida e no trabalho. O seu filme, sobre um editor de jornal alinhado ao PCI (Silvio Orlando) dividido entre lealdade ao partido e solidariedade com os companheiros de uma companhia circense húngara diante da invasão da União Soviética à Hungria em 1957, patina em incertezas que vão da concepção à produção e distribuição, passando por descompassos criativos com os companheiros de equipe. Na vida familiar, Giovanni também sofre uma crise com a possibilidade do fim da sua união com Paola (Margherita Buy), sua esposa e produtora com quem tem uma parceria de 40 anos. O mundo à sua volta, na política, na história e na arte, parece também lhe escapar. A crise da individualidade não conformista, deliberadamente anacrônica e utópica, a rebelião contra a entropia, a obsessão apaixonada pela linguagem, a necessidade de acertar as contas com as questões do passado e da contemporaneidade italiana, tudo isso é sempre o ponto de partida em todos os filmes de Nanni Moretti, seja em 1973 ou em 2024. Mas aqui são os próprios ideais e sonhos que alimentam sua descontinuidade temporal que parecem tomar a frente. O presente invade o passado. Contemplando seu fim, o cineasta pode talvez encontrar seu começo.