Em busca do tempo perdido: "Paris 1900"



Por André Bazin

Monsieur Eiffel e sua Torre, a Grande Roue e o Moulin de la Galette, Polaire e o talhe da 
sua cintura, Sarah Bernhardt, Mounet Sully, Lucien Guitry e suas vozes, os atentados anarquistas de um estilo tão em desuso quanto as cadeiras do primeiro Métro, as primeiras fontes Wallace e os primeiros mictórios, os primeiros aviões e o homem-pássaro que abre um buraco de 14 cm depois de saltar da Torre Eiffel, as inundações de 1910 e, por fim, o primeiro trem de pessoas alegres e motivadas que vão para a “der des der”, a primeira guerra mundial, com seu último vagão que diminui sob a palavra “Fim” como os vagões de plataforma nos happy-end dos filmes americanos!

Tal que em si-mesmo enfim o cinema o modifica, endurecido e como se já fossilizado pela brancura óssea da ortocromática, um mundo desaparecido volta a nós, mais real que nós mesmos e portanto fantástico. Proust encontra a recompensa do Tempo redescoberto na alegria inefável de se engolir em sua lembrança. Aqui, ao contrário, a alegria estética nasce de uma fratura, pois essas “lembranças” não nos pertencem. Eles realizam o paradoxo de um passado objetivo, de uma memória exterior à nossa consciência. O cinema é uma máquina de encontrar o tempo para melhor perdê-lo. Paris 1900 marca a aparição da tragédia especificamente cinematográfica, aquela do Tempo duas vezes perdido. Também de uma outra talvez, que nasce desse olhar impessoal que o homem coloca sobre sua história. Assim, nesta prodigiosa sequência do homem-pássaro em que parece evidente que o pobre louco fica com medo e julga enfim o absurdo da sua aposta. Mas a câmera está lá, afim de fixá-lo para a eternidade, e então ele não ousa finalmente enganar o olho sem alma. Se ele tivesse apenas testemunhas humanas, uma sábia covardia sem dúvida o levaria dali. 

Não acreditamos portanto que o mérito dos autores seja diminuído pela existência de todos os documentos cinematográficos de época, o único material que eles utilizaram. O sucesso deles é devido, ao contrário, a um sutil trabalho de médium, à inteligência das suas escolhas a partir de um material imenso. Ao tato e à inteligência da montagem, à todos os truques requintados do gosto e da cultura que ele precisou utilizar para domar esses fantasmas, sem esquecer a partitura de Guy Bernard que é um modelo da música para filmes.


O filme de Nicole Vedrès coloca ainda alguns problemas. Por exemplo este aqui. Por que a transposição de valores involuntária, em função exclusivamente da emulsão de película utilizada à época e ao contra-tipo, forma um pedaço de jardim, que Monet está prestes a pintar, exatamente igual ao mais impressionista dos quadros do pintor? Falo agora para os cineastas: por que chove exatamente quando um sargento é humilhado e quando Déroulède pronuncia um discurso? Por que o céu coloca-se sozinho em uníssono com o evento, de maneira mais precisa que a mais sutil ambientação de estúdio? Em uma palavra, como em cem, por que o acaso e a realidade têm mais talento que todos os cineastas do mundo? 

O que é o cinema? - 1° tomo: Ontologia e linguagem, p. 41-43. Tradução: Cauby  Monteiro.

Cineclube #5 "No quarto da Vanda"


Miguel Haoni comenta "No quarto da Vanda" (Pedro Costa, 2000)

Captação e edição por Wesley Conrado

O pitching


Por Stéphane Delorme

O pitching traz a má-sorte. A todos os roteiristas que estão quebrando a cabeça para encontrar um pitch para um projeto bem complicado, digamos com franqueza: se vocês não o encontrarem, é bom sinal. O pitching, simplista por essência, só serve para reduzir um projeto a uma fórmula de efeito encarregada de seduzir de imediato qualquer investidor em potencial. Que na indústria os empresários sem colhões exijam que um projeto seja pitchável em uma frase não surpreende em nada; mas que o cinema de autor também tenha atingido tais extremos é um fato que deprime profundamente. Em Cannes ou Rotterdam, o financiamento do cinema de autor funciona à base de encontros-relâmpago entre financiadores, produtores e realizadores: o pitch-dating está para o cinema assim como o speed-dating está para o amor. É o que se constatou no Festival de Locarno, onde vários filmes apostavam tudo num pitch bem convincente sem conseguir ultrapassá-lo (cf. Cahiers nº 681). Filmes tão diferentes como Shame de McQueen (Michael Fassbender viciado em sexo) ou Superstar de Giannoli (um pobre sujeito que todo mundo confunde com uma celebridade) não avançam uma polegada sequer além de seu pitch. Seguimos o gostosão obcecado e o proletário abestalhado sem nos colocarmos as questões antropológicas, sociais, morais, afetivas, sexuais e filosóficas que poderiam dar um pouco de consistência a seus calvários. Se o mínimo que podemos exigir de um filme de autor é a possibilidade de pensar com ele, esses filmes nos deixam bastante decepcionados e abandonados já após a primeira bobina (na época das bobinas, podíamos esperar transições ou saltos de uma bobina para outra – como ainda se vê em Tio Boonmee que pode recordar suas vidas passadas, que propõe um estilo diferente a cada bobina; hoje, o escoamento contínuo do digital combina perfeitamente com o escoamento sem surpresa do roteiro). O pitching faz efeito, mas passa rápido. Às vezes, é prolongado pelo maior tempo possível. Uma das calamidades do cinema de autor foi “o longa-metragem em queda” importado do cinema romeno, em que a única artimanha era a da dilatação temporal. Jogar com a espera mesmo sob o risco do tédio, despertar um forte desejo de saber, até a pancada final na cabeça: então era isso! O golpe do travesseiro em Amor de Haneke foi, nesse sentido, a demonstração mais lamentável do ano.


O drama do cinema de autor hoje são todos esses filmes de uma só marcha. Ora, um filme só fica de pé se ele troca de marcha sucessivamente. Há filmes em duas marchas (todos esses filmes partidos em dois, uma das raras invenções do cinema contemporâneo – New Rose Hotel, Mulholland Drive, A virgem desnudada por seus celibatários... – de que Tabu é um avatar), em três marchas (A visitante francesa), em onze marchas (Holy Motors). Seria necessário devolver à ideia de narração seu sentido pleno: a narração não é a distensão de um evento único e pitchável: que tédio! Ela é uma máquina de pensamento que monta conjuntamente os tempos, os possíveis e as vidas. Quando o escritor de Twixt, já enredado nas duas velocidades concomitantes do cotidiano e do sonho, mergulha o olhar no abismo, ele é apanhado numa terceira velocidade, a da vida de um outro (Coppola), uma imagem passada que se torna o olho do ciclone e que reconfigura a totalidade do filme. Ora, não pode haver olho do ciclone com um pitch; não há centro, não há segredo, não há mistério, nem salto possível para outra dimensão) da narrativa. Há apenas uma narrativa flat e um golpe de força: em inglês, o pitch designa o lançamento direto da bola no baseball. Aquilo que atinge de um só golpe. Mesmo que um longa-metragem seja uma viagem sinuosa, longa, obscura, ainda assim ele possui a claridade que cega de Elefante, de Gus Van Sant. O pitching, portanto, é o inimigo nº 1, aquele que paralisa o pensamento desde sua origem.


(Originalmente publicado em Cahiers du Cinéma, n. 684, dez. 2012, pp. 10-11. Traduzido do francês por Luiz Carlos Oliveira Jr.)

Marilyn




Por Serge Daney

O que é uma star? Um momento na história do cine. O momento em que a sétima arte se percebe atingida por um câncer fundamental: ele simula a profundidade, mas sua imagem é plana. Plana para sempre, esse pampa em baixos-relevos. 

Porém, desde sempre, as stars eram atores com relevo (a mais?), um peso de carne, um espaço próprio, uma profundidade-enigma. Corpos barrados ao prazer, destinados a sua imitação, ao gozo de sempre decepcionar e de ainda prometer. 

Sempre o cine estaria ocupado entre sua pobre imagem e o refinamento derrisório de truques, “a arte”, que fazem com que essa carne e esses ossos pareçam se mover no espaço, de verdade, utilizando a profundidade de campo como uma rampa. Mas o espaço das stars, são elas próprias/mesmas os limites de seus corpos, um equilíbrio que se mexe muito, um movimento tremido que, em nenhum lugar, se apressa lentamente.

O star-system é passado. Ele está atrás de nós, não muito longe. Ele se recompõe diferentemente segundo as novas tecnologias das quais não fazemos a mínima ideia. Ele se re-repara de outra maneira. O vídeo terá suas stars? Quanto às velhas, elas terminam como deve ser nas cinematecas e sobre os posters, reduzidas a uma superfície preta e branca. A inquietação que vinha dessa terceira dimensão dispersa foi substituída lentamente por um simples “congestionamento” do espaço, um imaginário. A imagem matou o ídolo. Isso aconteceu a Garbo, a Dietrich. 

Isso aconteceu a Marilyn? Não. E contudo, um dos gestos mais radicais, irascíveis e rápidos do século XX é a operação reduplicante através da qual Andy Warhol negara Marilyn-corpo e só conservara, em superfícies berrantes, o mesmo sorriso industrial.

Marilyn, do mesmo modo que os tomates Campbell, simbolizou também a arte moderna, a modernidade na arte: essa técnica de nivelamento, de um esgotamento desencantado, do luto alegremente assumido da terceira dimensão. Nunca uma star fora tão curiosamente celebrada — e negada. Caminhões de analistas glosaram sem se enganar sobre o impacto do gesto warholiano. Eles não estavam enganados. 



Mas eles tinham razão? Não. Pois algo havia desertado essa imagem industrial: o sofrimento. A vida de Marilyn, nós o sabemos, fora um vale de lágrimas. O que sabemos um pouco menos é que uma parte de seu sofrimento era físico. Mutilávamos um corpo e era o seu. Remodelado, desnaturado, forçado, refeito: um calvário. 

Última star no limite do preto e branco e da cor. Primeira star cujo sangue teria sido vermelho. Destino único e duplo: de um lado, a imagem, do outro, o corpo. A imagem irônica e o corpo de humor. Quantos são eles, quantas são elas, aqueles que, como ela, sofreram para serem (b)elas: falsas Marilyn cantando com um ar falso “My heart belongs to Daddy!”, contendo suas lágrimas travestidas, louros estridentes, loucas cosmopolitas, cirurgias estéticas do pobre e da pobreza. 

Só através dela que continua nos assolar a paixão de ser um outro. A paixão de ser uma outra. 

5 de agosto de 1982 

Retirado do livro Ciné journal – Volume I 1981-1982, p. 32-35. Tradução: Letícia Weber Jarek.

Bethânia bem de perto - a propósito de um show (1966)


Por Miguel Haoni

O mais profundo é a pele.

Paul Valery

Dirigido por Júlio Bressane e Eduardo Escorel, Bethânia bem de perto – a propósito de um show (1966) representou na trajetória de Bressane a segunda incursão no curta-metragem. Antes, no mesmo ano, ele havia rodado Lima Barreto - trajetória, mas a partir de Bethânia, Bressane delineará algumas de suas obsessões. Notadamente a busca por um diálogo com a música popular brasileira.

Uma das coisas que mais se destaca no curta é o protagonismo do som. Em primeiro lugar, por que o filme enquadra um momento muito delicado na história da música brasileira: os primeiros passos de ascensão da Tropicália, que culminará na segunda metade dos anos 60 com a consagração midiática nacional. Trata-se aqui de uma música então nascente, e das primeiras experiências de personagens, hoje célebres, que vinham da Bahia para o Rio de Janeiro, com destaque para a figura de Maria Bethânia, que chega ao Sudeste, a convite de Nara Leão, que a havia conhecido em Salvador, para participar do show “Opinião”. A partir deste momento começa a sua primeira temporada na boate Cangaceiro - onde será encontrada pelos realizadores. 

Logo no começo do filme somos lançados naquilo que Ismail Xavier qualifica como montagem vertical: o choque expressivo entre a imagem e o som. A câmera deambula na entrada da boate, flagrando os burgueses em fila, aguardando o início do show. Na banda sonora, Bethânia, em outro momento, discursa sobre a saudade que sente da Bahia e começa a descrever sua relação com a distância de casa, como introdução à sua performance. Este é um deslocamento fundamental para compreendermos este capítulo da música popular brasileira. O que se constrói a partir daqui é um diálogo entre o Nordeste e o Rio, capital cultural de então.

Para uma nova música, uma nova voz. E Bethânia representa, ao lado de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Tom Zé (o núcleo baiano da Tropicália), esta renovação no quadro da música brasileira. Tudo isto em função também da necessidade de ampliação do modelo representado pela Bossa Nova, movimento preparador da Tropicália, mas fundamentado em outros valores e que em função de seu berço estritamente burguês, travava um diálogo limitado com a tradição cultural do Brasil profundo, objeto privilegiado pela Tropicália.

Nesta apropriação do folclore, destacam-se as expressões religiosas – que no filme é expresso na música de São João e na Ave Maria em Latim, articuladas a certa mítica do universo sertanejo. Tudo impregnado do exercício de inovação, do diálogo com a música de vanguarda, numa aproximação entre o popular e o experimental – tônica desta nova geração.

O dado essencial deste filme, porém, é que se trata aqui de um exercício de Cinema Direto, cuja grande colaboração na construção do cinema moderno foi a implementação do “som direto”, captado no momento da filmagem através de um gravador portátil - como o célebre Nagra - e que facilitava a posterior sincronização. Isto permitiu um ganho de realismo nunca antes experimentado na história do cinema. Em primeiro lugar porque inscreve o aparato cinematográfico dentro da privacidade dos personagens. Em determinado momento, por exemplo, Maria Bethânia estranha e descreve a câmera como uma “máquina calminha”, pois esta, diferente do que ela deve ter visto em outras circunstâncias, era própria para este tipo de captação.

Bethânia Bem de Perto é um documentário observacional. A câmera na mão permite a investigação de nuances expressivas, gestos, detalhes. Por exemplo: a maneira como ela segura o cigarro ou o copo de cachaça, ou as fotos coladas no violão. Imprimindo naqueles bastidores uma função claustrofóbica, além da já referida invasão de privacidade. 


Aqui a nova música e a nova voz encontram uma nova forma de filmar, um cinema novo. Neste sentido, o filme interage muito mais com o que estava sendo produzido no Rio de Janeiro no contexto do Cinema Novo, por realizadores como Nelson Pereira dos Santos, Glauber Rocha, Joaquim Pedro de Andrade entre outros, do que com aquilo que Júlio Bressane, ao lado de Rogério Sganzerla, encampará a partir de 1969, como Cinema Marginal. 

Observação e acompanhamento são, nesta lógica, as funções principais do aparato. Entretanto, o nível de intimidade estabelecida no filme é tão grande que em determinado momento Bressane começa um bate-papo despretensioso: um leve jogo de perguntas e respostas. Aqui, interessa o estabelecimento de uma atmosfera confessional, um contato com a essência da personagem através da sua voz. A busca por um desnudamento. 

Neste instante nasce uma das passagens mais célebres do filme: a conversa sobre Roberto Carlos, então o mais popular artista brasileiro. O rei. O realizador pergunta à Bethânia se ela conhecia Roberto Carlos e ela responde que não. Depois admite que sendo Roberto Carlos o cara mais famoso do Brasil, seria impossível ela não o conhecer. Diz que ouviu E que tudo mais vá pro inferno (sic, o título da música é Quero que vá tudo pro inferno) e achou uma pobreza. E diz ainda, com uma impetuosidade arrogante, que poderia inovar Roberto Carlos se quisesse. 

Maria Bethânia aqui representa e expressa, na voz e no corpo, a juventude. Trata-se de uma garota (apesar da memória projetar a imagem da velha sobre a imagem da nova). Uma garota de vinte anos. Sua atitude, sua arrogância, a juventude de sua postura, capturadas pela câmera, fascinam. Na cena, por exemplo, em que o empresário estrangeiro procura contratá-la para uma turnê na Europa, enquanto a câmera vasculha os gestos e as expressões do grupo, vemos que todos em torno de Bethânia estão mais atentos, principalmente Caetano Veloso - que provavelmente foi um dos responsáveis da ida da irmã para o Sudeste. Enquanto isso ela folheia uma revista, tira um sarro.

Neste sentido, é curioso como, na banda sonora, nas passagens em que o filme nos transporta para o palco, a voz assume o primeiro plano enquanto a banda forma uma espécie de pano de fundo difuso. Isto encontra eco na imagem: a moldura expressionista com foco único de luz sobre a cantora, isolada, rodeada de trevas. Da jovem relativamente frágil dos bastidores Bethânia é transfigurada: por sua performance, por sua voz, pelo chiaroscuro aterrorizante, pelo gestual e liturgia do palco.


No depoimento sobre Roberto Carlos, flagramos a atitude da vanguarda em relação à cultura de massa. Roberto Carlos era o ponta-de-lança do movimento da Jovem Guarda, a tradução do rock americano e inglês no Brasil, que descambará desde seu surgimento, na música brega. 

A partir dos anos 1970, aquela agressividade roqueira da Jovem Guarda se transfigurará em lamúria. O movimento era o grande inimigo da Bossa Nova, cujos protagonistas o consideravam absolutamente alienante. Acusavam esta música, e os programas de rádio e TV de seus atores, de ser um veículo oficial da ditadura militar, uma de suas ferramentas de controle. Entretanto, na antropofágica salada cultural da Tropicália (me passa a salada, por favor) interessava abrir um diálogo com a cultura de massa, com o rock, o que está na base, por exemplo, do trabalho do grupo paulista Os Mutantes. À maneira de Oswald de Andrade e da Semana de Arte Moderna de 1922, a Tropicália interagia com absoluta curiosidade com o rock, com a guitarra elétrica e, também, com a Bossa Nova e a Jovem Guarda ao mesmo tempo. Incluído aqui o cinema de Júlio Bressane, no qual a música radiofônica de maneira geral será um signo fundamental. O próprio Roberto Carlos reaparecerá, no fim dos anos 60 no filme Matou a família e foi ao cinema

O curta porém, flagra no depoimento de Bethânia um momento preliminar: o da recusa. Trata-se aqui de uma transição. Se por um lado se recusa tudo àquilo que Roberto Carlos pode representar, por outro já flagramos também a recusa a um modelo excessivamente morno, o da bossa nova de João Gilberto por exemplo. Em determinado momento, no avançar das noites de apresentação, Bethânia exige dos músicos andamentos mais ligeiros (“Noel ta cortando a minha onda”), expressando o seu “ódio ao meio-termo”: ela prefere músicas violentas ou músicas românticas; odeia “Barquinho” porque esta fica entre “Marina” e “Viramundo”. 

Presenciamos o aumento na velocidade e agressividade, que parece propor uma aproximação mais justa com o “modelo Roberto Carlos”. Aproximação esta que, aliás, Maria Bethânia, bem como os outros membros da Tropicália, fará nos anos posteriores.

Outro episódio que marca esta transição é a presença de Billie Holiday na vitrola. Em determinado momento estamos num apartamento e o ambiente é completamente “bossa nova”: Zona Sul do Rio de Janeiro, cigarros, vinhos e a atmosfera pequeno-burguesa de vanguarda. Aqui pela abertura sonora e pela disposição dos personagens em cena, entramos neste universo: o da elite cultural, consumidora de jazz.

Já na última cena reencontramos este grupo de amigos e o registro empreende um exercício de aproximação e afastamento. Eles passeiam e brincam na cidade, raro momento de arejamento no filme, com a câmera registrando à distância, num estilo que contrasta radicalmente com as imagens coladas ao corpo dos bastidores. A despedida é a saída do claustro para o mundo, a fuga da gaiola e o vôo.