Os vigilantes




Por Jean-Philippe Tessé

Na varanda, uma mulher vigia na noite, a espingarda sobre os joelhos e a Bíblia ao alcance da mão. Do lado de fora, o diabo também vigia, ele nina a velha mulher sussurrando um cântico, ele espera que ela se canse, e ela, ela está prestes a ceder, a se fundir com ele no canto, sob a lua, “Leaning, leaning on the everlasting arms...”, ela está prestes a abrir sua porta ao demônio, este caçador noturno que veio pegar suas crianças e levá-las consigo – “então ele não dorme nunca?” perguntava uma das crianças. Nunca. A luz de uma vela apaga as marcas da silhueta do caçador no breu da noite. Ele escapou da vigilância da velha; desta vez, é certo, ele vai entrar na casa para devorar as crianças. É isso, ele está lá, mas a velha dá um tiro de espingarda e o demônio galopa em direção ao celeiro gritando como um demente.

A última vez que tínhamos ouvido seu grito de besta em fúria, ele tinha lodo até as coxas, os cabelos descontrolados, os dentes cerrados, a faca na mão: diante dele, as crianças deslizavam sobre o rio, numa noite ainda mais negra, ainda mais estrelada. Sobre a correnteza do rio, velam dois coelhos gigantescos e outros plácidos bichinhos. Mesmo se a América atravessa a sua Grande Depressão, miserável e debilitada, há sempre alguém para cuidar de duas crianças abandonadas. É preciso descer o rio para encontrar este vigilante. Se não é o velho na sua cabana, que vê passar o barco a vapor e se embebeda de álcool e de desgosto, serão os gentis animais nictalopes e a vovó da espingarda. Vigiar e proteger contra este demônio disfarçado de pastor maníaco, que se arrasta em seu delírio. Para agradecer à vigilante por tê-lo salvado da faca do caçador, John, o garoto, lhe oferece uma pequena maçã enrolada num paninho. Nunca ninguém tinha oferecido um tão belo presente. Este é O mensageiro do diabo, este é o mais belo filme do mundo.

Les veilleurs foi publicado na revista Cahiers du Cinéma, n° 684, dezembro de 2012. Tradução: Miguel Haoni.

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