Anne Buridan é Judith Cahen, da qual é o primeiro “longa-metragem”, longo de quase uma hora. Anne Buridan (se) coloca algumas questões bizarras, ao menos alguns acham bizarro que ela lhes coloque tais questões. Anne Buridan, à maneira do asno da fábula, cuja indecisão deixava morrer de inanição, parece sujeita a uma confusão mais atual, ao mesmo tempo política e amorosa (e é a inanição que ameaça), que aqueles que a cercam e que ela interroga, munida de uma câmera de vídeo, expressam muito bem, se defendendo algumas vezes, e às vezes às suas próprias custas: “O que é, para você, um ato político?”, “O que você faz com as pessoas que te atraem?”. Anne Buridan, de tempos em tempos, durante reuniões militantes em que o discurso patina, ao longo de seu trabalho de enquete que se converte, rapidamente, em busca pessoal – sua própria cruzada, possui o olhar que se fixa bizarramente, que parece se (nos?) perguntar o que ela está fazendo lá. Anne Buridan é uma personagem cômica; sempre deslocada, no meio dos outros, isso faz do filme um “retrato solitário com grupo”, digamos que na linha dos primeiros Moretti. Anne Buridan é uma garota em todas as suas fases, a fase da infância (as cenas lúdicas em Super 8, atravessadas pelo gore e pelo burlesco, “a criança que eu era me atormenta” na canção final...), a fase adolescente (grupo de amigos, comunidade militante, teoria e confusão, vida solteira...), e a fase de “mulher adulta” – da qual ela foge mais do que qualquer outra coisa (no gineco, com Camille de Casabianca e também da sua posição responsável atrás da câmera...). Anne Buridan é uma garota que se procura interrogando os outros, ao menos que se trate simplesmente do contrário e que ela procure apenas o outro que, no filme, se chama Joël. Anne Buridan, em todo caso, percebe bem que “não estamos no essencial”, tão bem que o efeito cômico, frequentemente hilariante, nasce da decalagem entre a palavra retórica como atitude de fachada, postura e impostura, e o desejo eloquente que sofre tanto para se expressar, deixa sem voz, o medo da passagem ao ato. Anne Buridan pressente, contudo, que o essencial da sua interrogação se dissipa frente a Joël, cujos passos de dança e algumas palavras precisas bastam para expressar uma forma concreta de desejo: e, em primeiro lugar, o desejo da jovem mulher, que o observa, que o filma, que o segue, que fantasia com ele... Anne Buridan e sua cruzada me lembram de uma frase ouvida em A paixão de Ana de Ingmar Bergman – aliás, cruzada e paixão têm percursos próximos; dizia-se ali: “O problema para uma pessoa que crê que existe uma verdade é que ela exige que os outros tenham a mesma fé”. Exigente, engraçada, Anne Buridan sabe desagradar a alguns para agradar a outros, de tal maneira que, e para esses últimos, o filme de Judith Cahen estreará certamente em breve.
La Croisade d’Anne Buridan, de Judith Cahen foi publicado originalmente na revista Cahiers du Cinéma, n° 488, fevereiro de 1995, p. 19. Tradução: Leticia Weber Jarek.
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