O mais visual e o mais sensual dos cineastas é também aquele que nos introduz no mais íntimo dos seus personagens, porque ele é acima de tudo um apaixonado fiel da sua aparência e, através desta, da sua alma. O conhecimento em Renoir passa pelo amor e o amor pela epiderme do mundo. A agilidade, a mobilidade, o modelo vivo da sua realização é a sua preocupação em ornar, para seu prazer e nosso gozo, o vestido sem costuras da realidade.
Renoir francês - André Bazin

A imagem

Rei Lear, Jean-Luc Godard, 1987.


Por Pierre Reverdy

"Imagem" é uma criação pura do espírito. Ela não pode nascer de uma comparação, mas da aproximação de duas realidades mais ou menos distantes.

Quanto mais a relação entre duas realidades aproximadas é distante e justa, mais forte é a imagem – mais força emotiva e realidade poética.

Duas realidades que não possuem nenhuma relação entre si não podem se aproximar de modo útil. Não há aí criação de imagem.

Duas realidades contrárias não se aproximam. Opõem-se. Raramente obtêm-se força desta oposição.

Uma imagem não é forte por ser brutal ou fantástica - mas porque a associação de ideias é distante e justa.

O resultado obtido determina imediatamente a justeza da associação.

A analogia é um método de criação - é uma semelhança de relações; ora, é da natureza dessas relações que depende a força ou a fraqueza da imagem criada.

O que é grande não é a imagem - mas a emoção que esta provoca; se esta última é grande estimaremos a imagem à sua medida.

A emoção assim provocada é pura, poeticamente, porque nasceu além de qualquer imitação, de qualquer evocação, de qualquer comparação.

É a surpresa e a alegria de se encontrar diante de uma coisa nova.

Não se cria imagens comparando (sempre frouxamente) duas realidades desproporcionadas.

Cria-se, ao contrário, uma imagem forte, nova para o espírito, aproximando-se, sem comparação, duas realidades distantes cujo espírito, somente, apreendeu a relação.

O espírito deve apreender e experimentar sem mistura uma imagem criada.

* * *

A criação da imagem é, portanto, um método poético poderoso e não nos devemos surpreender com o grande papel que representa numa poética de criação.

Para permanecer pura essa poesia exige que todos os meios concorram na criação de uma realidade poética.

Não se pode nisto fazer intervir os métodos de observação direta que não servem senão para destruir o conjunto, destoando. Tais métodos têm outra fonte e outro fim.

Métodos estéticos diferentes não podem concorrer numa mesma obra.

Não há senão a pureza dos métodos que ordena a pureza das obras.

A pureza da estética disto deriva.

L’image foi publicado originalmente na Revue Littéraire Nord-Sud, n° 13, em maio de 1918. Tradução: Eduardo Savella. 

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